Este jornal publicou ontem nota de repúdio assinada pelo presidente da União Cuiabana da Associação de Moradores de Bairros, contestando o artigo publicado neste espaço no último dia 7.
Considero sempre que qualquer contestação indica sinal de vida. Além do aspecto democrático que assegura a ampla liberdade de expressão a quem se sentir ofendido por qualquer publicação . Mas não é para contestar a nota de repúdio que estou escrevendo este artigo em cujo final tratarei daquela nota. Mas é para aproveitar uma frase usada pelo presidente da Ucamb, onde ele diz: “Se esquece o sr. Onofre Ribeiro – que não sabemos se é cuiabano – que este movimento comunitário tem uma história de mais de 20 anos…”.
Essa velha questão de ser ou não ser cuiabano tem sido levantada sempre quando uma pessoa não nascida em Cuiabá critica alguma coisa local. Imediatamente usa-se esta válvula de escape para apontar: fulano é ou não é cuiabano. Se não for cuiabano de nascimento não pode criticar.
Realmente, nos últimos 24 anos a migração modificou profundamente a composição sociológica de Cuiabá. Recordo-me nitidamente quando cheguei à cidade há 22 anos, que ser ou não ser cuiabano era muito importante porque a cultura local era essencialmente cuiabana.
Porém, de lá para cá, nenhuma família cuiabana, por mais tradicional que seja, pode dizer que não tenha um parente ligado a migrantes ou filhos de migrantes. E nenhuma família de migrantes pode dizer o contrário. Cuiabá cresceu e perdeu aquela divisão. É uma só. Pessoalmente confesso. Quando aportei em Cuiabá, vindo de Brasília, estranhei muito o modo de viver local. Pensei que jamais me adaptaria. Grande engano. E hoje, mesmo que um motivo superior me empurrasse para fora, não teria como perder os laços de meu filho mais velho, André, ser casado com Maria do Carmo, cuiabaníssima e mãe do Miguel e do Gabriel, ambos cuiabanos. Ou do Fábio, casado com Aline que mesmo sendo gaúcha viveu toda a infância em Cuiabá. Isso, sem contar que os 22 anos mais produtivos de minha vida e de minha mulher Carmem foram vividos aqui, onde construímos um inestimável patrimônio de amizades.
Na medida em que extrapolamos esse exemplo para tanta gente, realmente não dá mais para confinar Cuiabá e separar seus habitantes nas categorias dos nascidos e dos não-nascidos. Com todo o respeito, parece-me uma discussão muito superada. Vamos aos números. Em 1976, Cuiabá tinha menos de 100 mil habitantes. Hoje tem cerca de 500 mil. Cresceu quatro vezes, portanto. O crescimento veio da multiplicação vegetativa tradicional, da migratória e da vegetativa desses migrantes e agora da sua segunda geração que já nasce completamente cuiabana fora, portanto, daquela discussão de nascimento por tradição.
É muito positiva a miscigenação humana, porque ela produz miscigenações culturais e vivenciais. Fico felicíssimo por termos na família as misturas que temos. Aliás, nem que quiséssemos, se houvesse alguma razão para isso, poderíamos desfazer esses laços que a ordem natural entrelaçou.
Deixa de importar exclusivamente o nascer. Prevalece mesmo o ser cuiabano.
EM TEMPO:
Sobre a nota de repúdio assinada pelo presidente da Ucamb, sr. Adalberto Cavalcante, registro:
1- o assessor do ex-prefeito Meirelles a quem me referi, é claro que existe. Não citei seu nome porque não pedi sua autorização, além de que a Lei de Imprensa faculta ao jornalista omitir a sua fonte;
2- o movimento comunitário não pode negar que monopolizou a administração Meirelles. Se foi bom ou ruim, o tempo vai dizer;
3- quanto à divisão de Cuiabá entre a cidade do movimento comunitário e o restante, não cabe discussão porque todos vivenciaram. Se foi bom ou ruim, também é função do tempo julgar e,
4- quanto ao futuro do movimento na administração do prefeito Roberto França, é uma questão de competência envolvê-lo no seu espírito.