Nascido em 1654, na vila de Sorocaba, em São Paulo, Paschoal Moreira Cabral foi moldado desde cedo pelas tradições militares que corriam no sangue de sua família. Filho de um coronel, herdou o ímpeto desbravador e o espírito indômito que marcariam sua jornada pelo interior desconhecido do Brasil colonial. À frente de uma bandeira que partiu em 1699 rumo ao sertão profundo, foi ele quem cravou os primeiros passos na região onde se ergueria, anos depois, a cidade de Cuiabá.
Guiado pela esperança de riquezas e pela fé na Coroa, Paschoal e seus homens embrenharam-se pelos sertões hostis, enfrentando as intempéries da mata, os perigos dos rios e o mistério das serras ainda não cartografadas. Retornaria à região em 1716, subindo pelo rio Paraguai e alcançando o rio Coxipó dois anos depois, onde o destino lhe reservaria tanto a glória quanto a desventura.
Foi ali, nas margens do córrego do ouro, que Paschoal descobriu valiosas jazidas auríferas e se consagrou como guarda-mor do ouro, arrecadando, em apenas um ano, quatro arrobas – cerca de 60 quilos – do precioso metal, enviados à metrópole como tributo à majestade portuguesa. Contudo, nem mesmo sua lealdade e os frutos de seu labor foram suficientes para protegê-lo da ingratidão.
Em um desfecho amargo, foi traído por aqueles a quem fielmente servira. O governador de São Paulo, Dom Rodrigo César de Menezes, influente e ambicioso, o declarou inapto para cargos públicos, desviando a nomeação e os louros para Fernão Dias Falcão. Reduzido à penúria, o velho sertanista, que tanto entregara à Coroa, viu-se à margem da própria história que ajudara a escrever.
Em carta pungente ao rei Dom João V, Paschoal implorou por justiça, relatando sua miséria e o abandono em terras que ele próprio havia domado. Mas sua súplica ecoou em vão nos salões da monarquia, perdendo-se entre as intrigas palacianas e a frieza da burocracia colonial. Sem reconhecimento, sem fortuna, restou-lhe apenas a caridade, que exerceu com nobreza entre os desvalidos de Cuiabá, até o último de seus dias.
Paschoal Moreira Cabral faleceu em 1730, aos 76 anos, sem as honras que lhe eram devidas, mas não sem deixar raízes profundas. Seus restos mortais repousam sob as pedras da Igreja Matriz do Senhor Bom Jesus de Cuiabá, templo de fé e silêncio, onde sua memória ainda sussurra aos que sabem ouvir.
Hoje, séculos depois, o nome de Paschoal ressurge como símbolo de coragem, desbravamento e tragédia. Sua vida, marcada pelo esplendor da descoberta e pelo peso da injustiça, permanece entrelaçada à história da capital mato-grossense — como um herói quase trágico, que abriu caminhos para o futuro e pagou com o próprio esquecimento.