Praça Alencastro leva o nome da família que governou a cidade

Certamente a mais memorável e conhecida entre as praças de Cuiabá, o antigo Largo do Palácio, hoje Praça Alencastro, tem uma história repleta de transformações e significados. Em 1882, recebeu seu nome em homenagem ao governador coronel José Maria de Alencastro, que marcou seu tempo à frente da Província de Mato Grosso. Mais tarde, foi o sucessor Mário Correa da Costa quem deu um novo formato ao largo, transformando-o em um belo jardim, que passou a ser conhecido como Jardim Alencastro. Antes de se tornar o espaço urbano que conhecemos hoje, esse largo histórico era palco de eventos populares como concorridas touradas e corridas de cavalos, refletindo a cultura e os costumes da época. Ao longo dos anos, a praça passou a abrigar importantes instituições. Atualmente, ocupa um lugar de destaque como sede da Prefeitura de Cuiabá, mas já foi, em tempos passados, o Palácio do Governo, além de ter abrigado a Delegacia Fiscal do Tesouro e a Chefatura de Polícia, entre outras funções governamentais. A praça ainda conserva importantes marcos históricos, como o chafariz (atualmente desativado), a Fonte Luminosa e bustos de grandes figuras cuiabanas, que perpetuam a memória de personalidades que desempenharam papéis cruciais na construção da cidade e do estado. Assim, a Praça Alencastro se mantém como um símbolo não apenas da história política e social de Cuiabá, mas também da riqueza cultural que define a cidade. Photographias é um projeto cultural de pesquisa da central de documentação de dados do Almanaque Cuyabá. A iniciativa visa resgatar imagens históricas da cidade homônima. As ilustrações selecionadas nesta Categoria são, em sua grande maioria, de domínio público; outras, creditadas à fotógrafos, editores, colecionadores, instituições e a plataformas digitais congêneres.
Transporte de alimentos rumo ao Mercado Municipal

No século XIX, a comercialização de hortifrutigranjeiros e pescados na região ribeirinha do Rio Cuiabá concentrava-se nas imediações da “Boca do Valo”, ponto onde o córrego da Prainha deságua no rio Cuiabá. Posteriormente, o comércio foi transferido para a Praça Ipiranga, até que, sob a administração do presidente da Província de Mato Grosso, Augusto Leverger, em 1852, foi construído o primeiro Mercado Público no local onde atualmente funciona o Ganha Tempo. No entanto, durante a Guerra do Paraguai, o edifício perdeu sua função original ao ser requisitado pela Força Militar para servir como enfermaria aos soldados feridos. Com o fim do conflito e o aumento das demandas comerciais, o intendente-geral de Cuiabá, tenente-coronel Avelino de Siqueira, liderou a construção de um novo mercado público em 1910. Este segundo mercado foi erguido na Rua Formosa (atual Joaquim Murtinho), esquina com a Avenida Generoso Ponce (antiga Vilas Boas). Os tropeiros, vindos de regiões como Nobres, Rosário Oeste, Brotas e Guia, faziam sua primeira parada na Praça Clóvis Cardoso, onde uma nascente do Córrego Engole Cobra formava uma pequena lagoa. Ali, lavavam os pés após as longas viagens, o que deu origem ao nome inicial do bairro Goiabeiras: Lava-Pés. Em seguida, seguiam pela antiga Rua do Coxim, hoje chamada Isaac Póvoas, em direção ao Mercado Municipal. No quintal do mercado, descarregavam suas bruacas com produtos agrícolas e outros itens para comercialização. O Mercado Municipal destacava-se por sua imponente estrutura. Sua fachada principal voltada para a Rua Joaquim Murtinho era adornada por um portão de ferro. Suas amplas dependências e o extenso quintal, cercado por grades de ferro, tornaram-se um espaço multifuncional. Além do comércio, o local era ocasionalmente utilizado por companhias circenses que visitavam Cuiabá, como o inesquecível Circo Garcia. Uma de suas atrações mais célebres, o leão “Minelique”, encantou gerações de cuiabanos, consolidando o mercado como um ponto de encontros e memórias culturais da cidade.
A primeira Escola de Samba de Cuiabá: o ritmo que fez história

Em 1971, o Carnaval de Cuiabá ganhou um novo compasso com a criação da Escola de Samba “Deixa Cair”, a primeira de sua história. Idealizada pelos cariocas Beto e China, a escola trouxe para o coração do Mato Grosso o vibrante espírito do samba carioca, estabelecendo um marco cultural na cidade. Com dedicação e talento, os fundadores compartilharam o conhecimento das poderosas baterias do Rio de Janeiro, dando origem a uma tradição que ressoa até hoje. Beto, servidor do antigo INPS, liderou o projeto com o apoio de nomes notáveis como Zappa, Olinto Neves (irmão de Gabriel Novis Neves), Edmundo Barriga, e o icônico Carioca, além de muitos outros entusiastas que abraçaram a ideia de levar o samba às ruas cuiabanas. Unidos por essa paixão, deram início a um movimento que transformaria a face do Carnaval local. Os sons que pulsavam na bateria da “Deixa Cair” vinham de instrumentos como tamborim, repinique, agogô, tarau, contra-surdo, reco-reco e o imponente treme-terra, que ressoava como o coração da escola. Em pouco tempo, surgiram os primeiros batuqueiros cuiabanos, muitos deles jogadores do Mixto, que se juntaram à bateria, formando um conjunto de energia e técnica incomparáveis. Entre os nomes que impulsionaram a escola, o carnavalesco e vereador Wilson Diniz foi uma figura central, dedicando-se à organização dos desfiles e à criação de um espetáculo inesquecível. Outro pilar da “Deixa Cair” foi o senhor João Balão, proprietário do tradicional Hotel Santa Rosa, cuja generosidade e entusiasmo o tornaram um dos maiores apoiadores do Carnaval cuiabano. Um dos maiores atrativos da escola eram suas deslumbrantes dançarinas, mulheres de beleza marcante e talento inegável. Vindas das boates cuiabanas e cariocas, elas encantavam o público com seus trajes ousados e samba no pé, irradiando alegria e energia nas ruas da cidade. Com elas, a “Deixa Cair” não apenas desfilava, mas criava um verdadeiro espetáculo de arte e expressão. A “Deixa Cair” tornou-se muito mais que a primeira escola de samba de Cuiabá; ela foi um símbolo de inovação e paixão, inaugurando uma era de Carnaval que conquistou o coração da cidade. Seus desfiles, marcados por ritmo, criatividade e uma explosão de cultura popular, perpetuam seu legado na história festiva cuiabana.
A Fábrica de Pólvora do Coxipó: Guardiã da história Militar de MT

As ruínas da Fábrica de Pólvora do Coxipó, ocultas nas margens do Coxipó Mirim, são um testemunho eloquente do passado militar e político de Mato Grosso. Fundada em fevereiro de 1864, em pleno contexto de conflitos e disputas fronteiriças, a instituição foi um pilar estratégico para a Província, produzindo pólvora e carvão destinados ao Arsenal de Guerra e gerenciando os estoques de munições do território. Suas atividades perduraram até 1906, deixando marcas profundas na história local. De acordo com o professor Ednilson Albino de Carvalho, o encerramento das atividades da fábrica coincidiu com o desfecho de um período de intensas disputas políticas e militares na região. Essas tensões culminaram com a morte de Antônio Paes de Barros, conhecido como “Totó Paes de Barros”, então presidente do Estado, refletindo o impacto das divisões internas nas elites mato-grossenses. O local onde a fábrica foi erguida é hoje conhecido como o Distrito do Coxipó do Ouro, situado a 25 quilômetros do centro de Cuiabá. Antigamente, a região recebeu diversas denominações – Arraial da Forquilha, Paragem Forquilha, Arraial de Cima ou Capela, e Terra dos Índios Coxiponés –, revelando sua rica e multifacetada trajetória. À margem direita do Coxipó Mirim, suas ruínas evocam o passado e os desafios que marcaram a ocupação da área. A escolha estratégica dessa localização estava diretamente ligada às disputas fronteiriças e à necessidade de assegurar o direito à navegação nos rios Paraguai e Paraná, vitais para a economia e a defesa do Império. Além de sua função na produção de insumos bélicos, a fábrica tinha o papel crucial de garantir o bom funcionamento do armamento usado para proteger as terras imperiais. Hoje, o que resta da Fábrica de Pólvora do Coxipó não é apenas um vestígio físico, mas também um marco histórico que guarda memórias de um tempo de tensão e transformação. As ruínas silenciosas do passado oferecem um convite à reflexão sobre a importância de preservar e compreender a herança que moldou a identidade de Mato Grosso e do Brasil.
O caso do toalete que fez obra do aeroporto avançar

A trajetória do Aeroporto Marechal Rondon, em Várzea Grande, remonta a uma história de pioneirismo e desafios. O primeiro pouso registrado aconteceu em março de 1929, no bairro Campo Velho, em Cuiabá. Em 1939, foi inaugurado o aeródromo onde hoje fica a Vila Militar. Porém, o projeto de um novo aeroporto mais moderno só tomou forma em 1942, com a criação do Distrito de Obras do Ministério da Aeronáutica, que planejou a estrutura em Várzea Grande, escolhida por suas melhores condições operacionais. O terreno foi doado pelo governo estadual em 1949, e a pista de pouso foi inaugurada em 1956, mas o terminal de passageiros operava de forma improvisada até 1964, quando um novo terminal foi construído, representando um avanço significativo para a infraestrutura local. Em 1963, um episódio decisivo marcou a história do Aeroporto Marechal Rondon. Durante visita a Cuiabá, a então primeira-dama Maria Tereza Goulart, ao se deparar com as condições precárias do terminal, ficou indignada com a falta de infraestrutura. Os toaletes e as instalações, improvisadas desde a inauguração da pista em 1956, não condiziam com a importância estratégica do estado de Mato Grosso. Sensibilizada, Maria Tereza articulou diretamente com o presidente João Goulart e os ministérios competentes, solicitando urgência na conclusão das obras. Seu apelo foi ouvido, e em 1964, as melhorias no aeroporto foram finalmente realizadas, dando início a uma fase de modernização que perduraria nas décadas seguintes. Essa intervenção foi fundamental para transformar o Aeroporto Marechal Rondon em um centro de conexões aéreas essenciais para a região Centro-Oeste. O episódio não apenas acelerou as obras, mas também consolidou o Aeroporto Marechal Rondon como um elo essencial para Cuiabá e Várzea Grande, desempenhando um papel estratégico no desenvolvimento da região. Sua transformação em Aeroporto Internacional representa o legado de sua importância, refletindo o impacto duradouro que essas melhorias tiveram, e continuam a ter, no fortalecimento das conexões aéreas entre o Centro-Oeste e o restante do mundo.
O primeiro incêndio trágico ocorrido em Cuiabá

No dia 23 de março de 1952, Cuiabá foi palco de um dos mais dramáticos episódios de incêndio de sua história. Ao lado da Igreja Senhor dos Passos, no antigo Beco do Senhor dos Passos, deflagrou-se um grande incêndio no depósito de gasolina Shell, de propriedade de Benedito Afonso de Souza. A magnitude do fogo foi tamanha que ameaçou devastar todo o quarteirão, colocando em risco diversos estabelecimentos históricos da cidade, como a Drogaria Catedral, pertencente ao influente coronel Antônio Antero Paes de Barros, e a sede do ex-partido Social Democrata, instalada no imponente sobradão da esquina. O incêndio, alimentado pela grande quantidade de combustível armazenada no depósito, se espalhou rapidamente, avançando em direção à Igreja Senhor dos Passos, que esteve à beira da destruição. As chamas chegaram tão perto que o risco de perder um dos marcos religiosos mais importantes de Cuiabá parecia iminente. Além disso, a casa comercial Importadora, que funcionava nas proximidades, também foi gravemente ameaçada. Com seus estoques valiosos e a proximidade do fogo, a Importadora viveu momentos de tensão, temendo o colapso total. Esse episódio, imerso em tensão e com uma destruição ameaçadora à vista, passou a ser um marco decisivo na história de Cuiabá. Gravado na memória coletiva da cidade, serviu como um lembrete perene da necessidade urgente de adotar medidas preventivas contra incêndios, especialmente em áreas comerciais densamente povoadas, onde o risco era particularmente elevado. A tragédia, que parecia prestes a se abater sobre a cidade, foi evitada por um esforço conjunto, mas o episódio permaneceu como um símbolo de alerta, evidenciando os perigos do armazenamento imprudente de combustíveis e a fragilidade das construções antigas. O incêndio, embora controlado, se imortalizou como um divisor de águas na conscientização sobre a segurança urbana, deixando lições que ecoariam por gerações.
Padre da 1ª missa sofreu ataques em sua chegada a Cuiabá

A notícia da descoberta de ouro em Cuiabá, em 1720, foi recebida com grande entusiasmo, provocando o envio de diversos comboios rumo às minas. A jornada se iniciou às margens do afluente do rio Paraná, subindo até as águas do rio Paraguai, enfrentando desafios imensos ao longo do percurso. As tropas padeceram de fome, sem saber pescar, e sofreram ataques de onças, o que resultou em mortes. Em algumas embarcações, todos os integrantes faleceram, sendo seus corpos encontrados em avançado estado de decomposição por aqueles que seguiam atrás. Entre os que seguiram para Cuiabá estavam os capitães José de Sá Arruda e Jacintho Barbosa Lopes, além de outros militares. Um fato notável dessa comitiva foi a presença de quatro religiosos, cuja contribuição espiritual seria decisiva para a fundação da cidade: os padres Florêncio dos Anjos, carmelita; Jerônimo Botelho e André dos Santos Queiroz, ambos da ordem de São Pedro; e Pacífico dos Anjos, franciscano, irmão do capitão-mór Jacintho Barbosa Lopes. No final daquele ano, o grupo chegou ao arraial que mais tarde seria conhecido como São Gonçalo. Daí, seguiram para o Coxipó acima, no lugarejo então denominado Forquilha, onde fundaram um novo arraial e ergueram uma igreja dedicada a Nossa Senhora da Penha de França, que permanece até hoje como um marco histórico. Foi nesta pequena paróquia que o padre Jerônimo Botelho celebrou a primeira missa em Cuiabá, seguida pela segunda celebração a cargo do padre André dos Santos Queiroz. Esses acontecimentos marcaram o início da presença religiosa na região e o início da fundação de Cuiabá, dando início a um ciclo de evangelização e desenvolvimento que moldaria o futuro da cidade.
Das primeiras rodas de Cuiabá: automóveis, ônibus e diligências

A história da mobilidade em Cuiabá guarda momentos marcantes que refletem o progresso e a transformação urbana da cidade. Um desses marcos encontra-se na antiga Travessa Senador Metelo, conhecida à época como Beco do São Gonçalo. Ali, em uma modesta estrutura de zinco, funcionava o galpão da Garagem Dorsa, pertencente à firma Dorsa & Irmãos, pioneira na importação de automóveis na região. Essa empresa protagonizou um evento histórico ao vender ao então presidente do Estado, Dom Aquino Corrêa, o primeiro automóvel que chegou à capital mato-grossense: um luxuoso Landau Let, de cor preta, conduzido pelo chofer Francisco Zani. Além do comércio de automóveis, o mesmo galpão foi ponto de partida para outra inovação no transporte local: a primeira linha de auto-ônibus que conectava o 1º Distrito ao 2º Distrito (Cuiabá-Porto). A iniciativa foi lançada durante o governo de Dom Aquino, que ordenou a preparação da Rua Nova – hoje conhecida como Avenida Dom Aquino – para garantir o tráfego das modernas conduções. A passagem custava inicialmente 200 réis, valor que subiu para 300 réis no ano seguinte. Essa conexão facilitou o deslocamento entre os principais pontos da cidade, marcando o início de um transporte público organizado. Do galpão aos campos do Coxipó: A era das diligências Muito antes da chegada dos automóveis e ônibus, Cuiabá já experimentava formas inovadoras de transporte. Registros históricos indicam que em 1875, o negociante André Gaudie Nunes organizou um serviço pioneiro para proporcionar um passeio entre a cidade e o povoado do Coxipó. A novidade era uma elegante diligência, puxada por quatro animais e com capacidade para transportar até 12 pessoas por viagem. Um anúncio publicado à época, com um tom convidativo, descrevia a experiência: PASSEIO PARA O COXIPÓ No domingo, 20 do corrente, achar-se-á no Alto da Misericórdia uma diligência puxada por quatro animais, a qual partirá às 6 e 8 horas da manhã, voltando às 4 e 6 da tarde, conduzindo até 12 pessoas em cada viagem. Vendem-se bilhetes para ida e volta ao preço de 2$000 na Rua 13 de Junho, junto ao mercado. Essas viagens não eram apenas deslocamentos, mas eventos sociais, proporcionando aos cuiabanos a oportunidade de explorar as margens bucólicas do Coxipó, em um misto de aventura e lazer. Uma Cidade em Movimento Esses episódios, aparentemente corriqueiros, revelam o quanto Cuiabá já respirava modernidade e experimentava transformações que anunciavam o progresso. Do ruído das rodas de diligências ao ronco dos motores do primeiro automóvel, cada veículo trazia consigo não apenas a promessa de novos tempos, mas também o desejo de conectar pessoas, ideias e histórias.