Primeiro Encontro Nacional de Alternativas Penais reúne autoridades e enaltece trajetória de jurista

Com o objetivo de promover o diálogo sobre medidas alternativas à prisão, à superlotação carcerária, à reincidência criminal e à desigualdade no acesso à Justiça, além de estimular melhorias no sistema de justiça criminal brasileiro, o Poder Judiciário de Mato Grosso, está realizando o 1º Encontro Nacional de Alternativas Penais, idealizado pelo Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e Socioeducativo de Mato Grosso (GMF-MT) e pelo Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP), realizado na sede do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).
 
O evento que teve início nesta quarta-feira (24 de julho) e vai até sexta-feira (26), conta com apoio institucional do Poder Judiciário de Mato Grosso e da Escola Superior da Magistratura (Esmagis-MT) e com a parceria do Ministério Público Estadual, da Defensoria Pública Estadual, do Tribunal de Contas do Estado, da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, do Governo do Estado e da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
 
Durante a abertura do Encontro, o supervisor do GMF-MT, desembargador Orlando de Almeida Perri, relatou sua experiência empírica, inspecionando todas as unidades prisionais do estado, e defendeu que as alternativas penais devem começar logo na audiência de custódia, desde o primeiro delito cometido pelo indivíduo, a fim de evitar a reincidência. “Eu defendo que essa atenção tem que começar na audiência de custódia e é isso que nós queremos implantar aqui no estado de Mato Grosso, talvez numa experiência inédita, queremos e estamos fazendo com que as pessoas que passam pelas audiências de custódia sejam encaminhadas para a Central de Alternativas Penais, inaugurada recentemente”, disse, complementando a importância de profissionais da área da Saúde, como psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais, na atenção à população carcerária, especialmente aqueles dependentes químicos.
 
Um dos organizadores do Encontro, o coordenador do GMF-MT, juiz Geraldo Fidelis, destacou a honra do Judiciário mato-grossense em promover a reunião dos principais nomes e dos profissionais que atuam no ramo das alternativas penais. “Estamos muito honrados em Mato Grosso por receber autoridades nacionais e internacionais da Execução Penal. Estamos aqui para discutir qual o melhor caminho para trilharmos, buscar as boas experiências, mostrar também o que tem de bom em Mato Grosso. É bom nosso estado estar nesse nível de discussão”.
 
Presidente do Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP), o professor Carlos Eduardo Adriano Japiassú lembrou que os problemas no sistema penal brasileiro remontam ao Brasil Império, quando já haviam más condições dos presídios e superlotação dos mesmos. Trazendo para a contemporaneidade, o estudioso do tema apontou ainda que os últimos 40 anos da história brasileira apontam o que chamou de “paradoxo brasileiro da liberdade x prisão”. “A história do Brasil como Estado independente é a história do sistema penitenciário com problemas. Se olharmos para a nossa situação atual, nós vivemos, nos últimos 40 anos, o período mais livre e democrático da história do país. E no período da história brasileira em que houve mais liberdade, nunca se encarcerou tanto”, comentou.
 
Conforme Japiassú, o 1º encontro Nacional de Alternativas Penais é o momento para reflexão sobre essa realidade. “É o momento para refletir sobre como chegamos aqui, porque estamos assim, para ver onde a gente pretende ir nesse sistema”.
 
“Dimensão e alcance das alternativas penais” – Para a primeira mesa do Encontro, presidida pela juíza Edna Ederli Coutinho, membro do GMF-MT, foram convidados dois palestrantes: o desembargador do TJBA e supervisor do GMF daquele estado, Geder Luiz Rocha Gomes, e o advogado criminalista e professor de Direito da UFMT, Giovane Santin.
 
O magistrado parabenizou o TJMT por abrir um espaço para discussão de temas tão relevantes. “Vivemos um momento de muita preocupação com a segurança pública, com os caminhos que tomamos em relação a esse tema. E haver um espaço que discuta isso é realmente uma atitude extremamente democrática e preocupada com o jurisdicionado”.
 
Com relação às alternativas penais, o desembargador Geder Gomes apresentou um breve panorama histórico do sistema penal brasileiro, destacando mudanças recentes, como as Centrais de Alternativas Penais, o Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária, abordou ainda os impactos da pandemia e as deficiências estruturais.
 
“As alternativas penais são sempre muito polêmicas porque, de um lado, nós temos a sociedade que reclama uma punição mais dura, entendendo que assim nós vamos ter uma diminuição da violência. De outro lado, para quem estuda mais aprofundadamente, pra quem está no dia a dia, nós sabemos que têm públicos diferentes. Tem o público que realmente você tem que enfrentar com uma lei penal mais dura e tem o público que não. E para esse público que não, há essa diferença a ser feita. Nós temos as alternativas penais exatamente para evitar essa junção de públicos para que justamente a gente não tenha esse fenômeno que está acontecendo muito no Brasil, que é a superpopulação carcerária”, declarou.
 
O advogado e professor Giovane Santin desacou a complexidade do sistema prisional no Brasil e fez críticas ao sistema vigente, que carece de mudanças drásticas, de modo a reduzir as desigualdades sociais existentes na política de encarceramento de viés punitivista. “Sabemos que esse modelo não está produzindo nenhum tipo de resultado para a questão referente à criminalidade e segurança pública. Então a ideia é trazer uma crítica para, a partir daí, buscar alternativas para o problema voltado ao sistema de justiça, que é um fenômeno social complexo”.
 
Na visão de Santin, o principal problema atual é o encarceramento em massa. “Não é a toa que as facções, as organizações criminosas nascem a partir dos presídios. Isso não é por acaso e é por isso que se fala que o crime é organizado. Uma vez que nós tornamos a situação de convívio dentro de um estabelecimento prisional, insuportável como é, não buscando as promessas declaradas pelas funções da pena e tornando o ambiente cada vez mais hostil, é óbvio que a consequência será clara. Não temos soluções para isso, mas sabemos o que esta dando errado, e isso precisa ser discutido para que possamos, a partir daí, diminuir a diferença social existente entre as pessoas que estão se deparando com o sistema de justiça criminal e aqueles que são escolhidos para não fazer parte dele”, comentou.
 
Homenagem à Vera Müller – O evento contou ainda com uma homenagem feita à magistrada aposentada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), Vera Müller, que recebeu uma placa em reconhecimento por sua trajetória na busca por um sistema penal mais humano e eficaz no tratamento das pessoas. “Eu quero agradecer a todos os parceiros de jornada. Não seria possível chegar até aqui sem a colaboração de todos. Eu sei que, no fundo, é uma delicadeza profunda lidar com o ser humano. Eu agradeço a todos que nesta trajetória estivemos juntos e todos que ainda vamos agregar para conseguir – quem sabe – a transformação nossa e das pessoas. Eu acredito que é possível mudar, é uma trajetória difícil, longa e a pessoa tem que querer. Estamos juntos nisso”, declarou.
 
Vera Regina Müller foi uma das responsáveis pela redação do primeiro projeto do Brasil voltado para a criação de uma infraestrutura para acompanhamento de penas alternativas. Após sua aposentadoria na magistratura, no início dos anos 2000, ela foi convidada a criar a Política Pública das Penas e Medidas Alternativas, no Ministério da Justiça, tendo viajado por todo o país para conhecer a realidade e dialogar com as autoridades envolvidas no projeto, que culminou na criação da Cenapa – Central Nacional de Penas e Medidas Alternativas, em dezembro de 2000.
 
A placa de reconhecimento foi entregue à jurista pelos desembargadores Helena Maria Bezerra Ramos e Orlando Perri e por Carlos Eduardo Japiassú.
 
Participaram do evento diversas autoridades, como os desembargadores do TJMT Helena Maria Bezerra Ramos, Paulo da Cunha, Hélio Nishiyama e Jorge Luiz Tadeu Rodrigues; o secretário de Estado de Segurança Pública, coronel PM César Augusto de Camargo Roveri; o primeiro subdefensor público-geral de Mato Grosso, Rogério Borges Freitas; o presidente da Comissão de Direito Penal e Processo Penal da OAB-MT, Leonardo Luis Nunes Bernazzolli; representantes dos GMFs de diversos estados da federação, entre outros.  
 
#Paratodosverem. Esta matéria possui recursos de texto alternativo para promover a inclusão das pessoas com deficiência visual. Foto 1: desembargador Orlando Perri discursa no púlpito. Ele é um senhor branco, de cabelos lisos e grisalhos, olhos escuros, usando camisa branca, terno azul e gravata vermelha. Foto 2: Carlos Eduardo Japiassú discursa no púlpito. Ele é um homem branco, de cabelos lisos e grisalhos, olhos claros, usando camisa branca, terno preto e gravata preta de bolinhas brancas. Foto 3: foto em plano aberto que mostra o auditório do TJMT repleto de pessoas na plateia. No palco, os palestrantes Geder Gomes e Giovane Santin, sentados do lado direito, e a juíza Edna Coutinho do lado esquerdo. Foto 4: da esquerda para a direita: Carlos Japiassú, a desembargadora Helena Maria Bezerra Ramos Ramos, a homenageada Vera Müller (segurando a placa) e o desembargador Orlando Perri.
 
Celly Silva/ Fotos: Alair Ribeiro
Coordenadoria de Comunicação Social do TJMT  

Fonte: Tribunal de Justiça de MT – MT

Almanaque

Almanaque

O Almanaque Cuyabá é um verdadeiro armazém da memória cuiabana, capaz de promover uma viagem pela história em temas como música, artes, literatura, dramaturgia, fatos inusitados e curiosidades de Mato Grosso. Marcam presença as personalidades que moldaram a cara da cultura local.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *